quinta-feira, 9 de maio de 2019

Anatomia de um estupro

Para que meu sonho (palavra desgastada que nem sequer gosto de usar) se materialize, dadas as minhas condições econômicas, o único meio de criar uma comunidade intencional é vendendo a única coisa que tenho, minha casa.

Quando planejei e construí sempre soube que ela (a casa) não era só pra meu uso. Visava o bem comum, caso contrário, que criatura seria eu que defende o bem comum, mas vive em nome do acúmulo, das consanguinidades e outras imoralidades assemelhadas.

Porém, para isso, criei um 'algo mais' onde ganharia um pouco mais financeiramente e teria minha mudança financiada.
Apesar do sacrifício, é usar o sistema contra o sistema.

Claro, a sensação de estupro se mantém.

Ganhar mais e viver pior.

No fim, é o que todos (ou a maioria) fazem.
É uma inversão bizarra de prioridades e decência humana.

Enfim, agora tenho que enfiar a 'viola no saco' e trabalhar o produto (minha casa na praia, parecendo um classe média nojento) para que ele viabilize algo maior do que eu e meu ego esfarrapado.

Sim, decidi fazer sozinho essa empreitada.
Não sou um highlander e tenho um tempo finito e preciso que minha existência tenha dignidade e uma finalidade além de acumular porcarias, passar pra criaturas não merecedoras (apesar do afeto e do DNA) e não fazer em vida o que eu sempre preguei.

O sentido da vida, acima de tudo, é algo que está além do EU.
Apesar (pra quem não compreende) de ateu, creio na dádiva, na moral (nada a ver com moralismo), no bem comum, na generosidade e num objetivo maior que te transcenda, não no sentido tosco/religioso/newage, mas sim, no retorno à coletividade aquilo que eu usei para ser eu, que não é meu, e deve voltar ao bem comum.

Não sei o desenrolar disso, mas sei que, em algum canto obscuro desse mundo inóspito e indecente (como o neoliberalismo FODEU a todos... sorry, não há outra expressão melhor... ou menos pior), há de existir pessoas que queiram deixar um legado, ainda que pífio, ainda que minúsculo.

Estou cá, na grande Campinas agora pra aumentar as condições de alavancar isso.

Não creio em 'pensamentos positivos', 'energias mágicas', ' justiça divina' (qual das divindades? qual dos valores moralistas estarão em questão? por que uma das milhares de divindades merece mais fé que outra? etc, etc,etc), 'natureza justa' (ela está pouco se fodendo conosco, Isabelle Stengers descreveu belamente a Gaia dela) e demais baboseiras. Nosso mundo, aquele que criamos como interpretação humana e própria da realidade, não quer, não deseja, não espera, não acha isso ou aquilo... somos apenas criaturas finitas e desprezíveis que DEVEM a sua sociedade e as demais criaturas vivas sempre, é aí que residem as grandes grandes questões morais.

Em tempos de chefe de executivo lunático, cercado de neoliberais atrasados, "filósofos de botequim" que mal ensino elementar tem, fanáticos religiosos, ruralistas inescrupulosos, laranjas, milicianos, belicosos e demais escória da sociedade, é tempo dos 'bons' (sim, existe um mínimo de referência, como nos traz bem Sam Harris) se juntarem pra criar um legado pras futuras gerações... se é que elas existirão...

Confuso, eu sei.

Um diário não é linear.

A história, aquela curtíssima que temos, será minha testemunha.
Os bons existem ainda?

Não sei.
Veremos.



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