domingo, 18 de junho de 2017

Milgram, me acorda aí cara!

O polêmico experimento de Stanley Milgram já tem décadas.
É uma espécie de versão experimental da Banalidade do Mal de Hannah Arendt.
O documentário sobre ele e o experimento está na Netflix e foi repetido várias vezes ao longo desses anos.



Ontem fui a uma festa de aniversário das filhas de um amigo "das antigas".
Já não o via há uns 2 anos e nossa relação sempre foi de "camaradagem superficial", isto é, eu sei muito bem os assuntos que não são possíveis tocar ao estar com ele.

Mais jovem que eu uns 15 anos, o que por si só costuma bastar para alguns PB (petabytes) a menos de informação e associado a uma formação intelectual deficitária em meio a uma família classe média baixa acendente, a quase determinante criação de um jovem conservador com discursos self made man foi (não só por isso claro) o resultado.

Exatamente por isso nunca conversei nada mais além de frivolidades regadas a muito álcool, temendo que qualquer discussão mais profunda fosse subtrair o afeto que tenho (tinha?) por ele.

Este é o mesmo motivo que evito contato com muitos amigos, o medo terrível da decepção.

Um amigo que não vejo mais é uma parte bela da minha história, alguém de quem tenho boas lembranças e alguém que me faz ter um pingo a mais de esperança na humanidade.
Um (ex-)amigo que "enxergamos mais de perto" é um exemplo terrível dos experimentos de Milgram e da Banalidade do Mal, alguém vil e perverso que me faz odiar parte da minha própria história, me faz viver o luto de uma perda e, obviamente, perder completamente a esperança na humanidade,

Adolf Eichmann: marido exemplar, bom pai de família,
trabalhador e um ótimo amigo. O mal está mais perto
(inclusive dentro de nós mesmos) do que gostaríamos.

Os levianos (ou estúpidos mesmo) me perguntam 'se todos devem concordar com minhas posições' ou que 'o bem e o mal são subjetivos' ou ainda que isso ou aquilo 'é cultural'.

Evidentemente que o bem e o mal maniqueísta sem uma boa análise da moralidade humana é uma estupidez, assim como negar a existência do relativismo cultural, mas qual é o limite?

Bom, não temos uma resposta definida, mas algumas coisas podem ser sim classificadas como o mal, e pessoas que as defendem inseridas nesse imenso grupo.

Sam Harris é muito direto em seu A Paisagem Moral e pergunta "se apedrejar alguém por adultério" ou "jogar pessoas de prédios por sua vida íntima" pode ser considerado "subjetivo" ou com base no "relativismo cultural".

Por isso essa confusão e esse incômodo em experiências e trabalhos sobre o mal como o de Milgram. Eles são incômodos, assustadores e até mesmo deprimentes.
Diferente dos vilões de Hollywood, o mal não tem cara, ou melhor, não é caricato e de evidente identificação, pois cara ele tem, basta na verdade um espelho.

Sem a moral (enfatizo: moralismo não é moral!) e a constante reflexão a cerca do bem e do mal, ainda que não haja resposta definida ou exata como desejaríamos, estamos todos perdidos.

No meio da festa meu temor se concretiza (evidente que isso iria acontecer), ele solta algo em defesa do infame Bolsonaro.



Aí repousa o problema dos discursos simplórios da "minha opinião", da "liberdade" e do "direito ao voto", ela esconde a perversão em certas posições

Assim como defender este sistema econômico social (por definição amoral - que notoriamente está nos levando a abismos e injustiças sociais além da completa aniquilação de nosso patrimônio ambiental), defender um crápula (Bolsonaro's da vida) que espuma ódio nas palavras e que não esconde seu moralismo, sua belicosidade, seu machismo e demais características que o tornam o mais puro representante do mal só pode colocar pessoas aparentemente "bacaninhas" neste grupo malévolo.

Existem opiniões e opiniões.
Há um evidente limite entre o que invade o espaço alheio (seja entre quatro paredes ou seja na exploração e aniquilação contumaz de grandes massas) e uma simples posição de pensamento equivocada ou não.

E ainda questionam meu auto-exílio...



sexta-feira, 2 de junho de 2017

O mar, quando quebra na praia

Dorival Caymmi se estivesse vivo teria morrido de desgosto.
Será que por isso morreu?

Desde que me mudei pra praia me perguntam por que continuo branco, digo, não bronzeado.

Antes de mais nada esclareço que adoro o mar.
Sempre gostei e o achei lindo. Sou mergulhador avançado pela PADI também.

O problema é que não curto muito o sol e justamente por morar na praia acabei desenvolvendo certo nojo do mar.

Passear a pé pelas calçadas imundas e as belas casas com seus respeitáveis moradores varrendo excrementos e urina de cachorro quintal a fora me fez desenvolver essa "fobia".

Como é sabido, as águas pluviais vão sarjeta à baixo e a minha rua dá diretamente na praia.
É óbvio que em outras cidades o sistema é o mesmo, exceto que vai para algum córrego, rio e por fim, pro mar, mas aqui me deu essa visão brutal, nua e crua da coisa.


Sempre achei absurdo o jeito do brasileiro em lidar com a coisa pública, no caso aqui me referindo ao espaço público em geral. Essa coisa abominável de o que é público é de todos porém não é de ninguém.
Países evoluídos como o Japão por exemplo, justamente porque é de todos que merece cuidado de todos, e ainda que eu não possa usar para meu uso privativo, cabe-me a decência de zelar por ele.

Notem que nem precisei entrar na lenga-lenga do "ecodiscurso".
Certa dose de moral já seria o suficiente para evitar esse descalabro.

Curiosamente muitos (para não dizer a maioria) dos moradores daqui não vão muito à praia e olha que ela nem é (muito) poluída ou com (muito) lixo na areia.
Acho que mesmo dentre os boçais que acham que "a rua é pública" (e o mar também) ficou um ranço pelas próprias atitudes.

Enfim, o 'esgoto do mundo' ocupa a maior parte da superfície terrestre, e suas criaturas e sua biodinâmica foi o que nos permitiram e ainda nos permitem existir.

Mas como disse o Agente Smith, nós somos uma praga e é esse legado "respeitoso" que deixamos para as outras espécies e para os nossos semelhantes.