segunda-feira, 11 de março de 2013

A vingaça dos velhos headbangers - Lado B

Meu post anterior me fez pensar mais sobre o fato de termos (os velhos headbangers) virado um clássico.
O rock'n roll surgiu nos anos 50 como evolução (leia-se adaptação/reação a um momento histórico) do blues e foi também o nascimento de uma ruptura, onde "a música dos filhos é uma e a dos pais é outra".

A longevidade e a qualidade do Metal curiosamente trouxe o rock de volta a toda família. Como disse Alice Cooper, um dos precursores do Shock Metal, "agora eu sou um entreteinimento familiar e os avós vem com os netos nos meus shows".

Por que viramos um clássico?
Bom, não tenho a pretensão de fazer um tratado histórico-cultural acadêmico sobre o tema, mas resumir a evolução dessa música e trazer alguns elementos que a fizeram perdurar décadas e a forjar (bom termo pro assunto! rs) seu lugar na história da boa música.

Os principais pais do rock são Chuck Berry, Bo Diddley e Little Richard, tendo os expoentes brancos muito mais papel na sua divulgação/propagação do que propriamente na música (o nascimento em si, não negando contribuições musicais importantes), cito principalmente Elvis Presley, Carl Perkins, Jerry Lee Lewis, Buddy Holly e Roy Orbison.

Sua evolução notadamente originada do rhythm and blues (lembrando que o termo R&B norte americano designa algo diferente do R&B britânico) a torna uma música de origem negra (usem a palavra politicamente correta que quiserem), ou seja, uma black music.
Segundo o próprio Little Richard, basicamente adicionou-se o boogie-woogie ao blues
Ray Manzarek (The Doors) diz: "Se não fossem os negros norte-americanos estaríamos fazendo minueto e dançando na ponta dos dedos".

A distorção nas guitarras apareceu com Jeckie Brenston and the Delta Cats, quando o produtor San Philips decidiu usar o som de um alto-falante rachado durante a gravação no amplificador da guitarra, em Memphis, Tennessee, 1951.
Em Londres na década de 60, quando altos volumes (e aí devemos citar Jim Marshall, fundador da Marshall Amplifiers), a distorção e os demais elementos do rock'n roll foram misturados e 'acelerados', assim como influências diretas do blues e do jazz foram integrados criou-se o hard rock, onde destaco The Kinks, The Who e claro, a "Santíssima Trindade do Rock": Led Zeppelin, Deep Purple e Black Sabbath.

Enquanto isso nos EUA, Jimmy Hendrix levou a guitarra a caminhos nunca trilhados e expandiu o horizonte musical desse instrumento, sendo que o mesmo foi levado a incríveis velocidades através, principalmente, de Dick Dale, da surf music.
O garage rock americano contribui com a expontaniedade e a agressividade bad boy, onde destaco Ted Nuggent, Steppenwolf, MC5 e Blue Cheer. 

Em 70, as tours, que começaram por absoluta falta de dinheiro pra gravar um disco, não aceitação das gravadoras e (in)visibilidade nas rádios, ficaram famosas com o Kiss. Porém, no fim dessa década a (porcaria da) música disco invadiu os EUA e quase arruinou com o rock de lá.

O Big Rock (definição dos próprios) do Van Halen apareceu ainda na década de 70 pra resistir ao disco no EUA.

Voltando ao outro lado do Atlântico, em 70 o R&B e o Hard Rock britânico estavam em alta e sem dúvida, a "Santíssima Trindade do Rock", em especial o Black Sabbath, "pariram" o Heavy Metal.

O Led Zeppelin era a banda de R&B mais "pesada", com a guitarra distorcida de Jimmy Page, o front man estiloso Robert Plant e seus fortes elementos de blues e folk.
O Deep Purple trouxe grande qualidade musical com os riffs lendários de Ritchie Blackmore, a bateria pesada e rápida de Ian Pace e claro, a erudita influência dos teclados de Jon Lord, associados aos grandes letristas Ian Gillan e Roger Glover.

Mas foi o Black Sabbath, com os tons jazzísticos de Geezer Buttler e  Bill Ward, o vocal perturbado de Ozzy Osbourne, as experimentações clássicas da pesada guitarra de Tonny Iommi (a clássica música "Black Sabbath" foi inspirada em Mars, de Gustav Holst), o tom sinistro e o visual sombrio, que foi o pai, ou pelo menos o padrinho do heavy metal.
O ambiente sombrio, opressor e pobre de Birmingham foi o berço e evidentemente a influência do que alguns chamam, indo além da paternidade, de a primeira banda de heavy metal do mundo.

Rainbow, ACDC, Rush, Van Halen e várias outras bandas firmariam o heavy metal como estilo musical, mas foi o Judas Priest que consolidou o que seria o heavy metal moderno, com as roupas de couro preta, o abandono definitivo do blues de 12 compassos e usando 2 guitarristas em perfeita simbiose.

Depois da onda punk no final da década de 70 atrapalhar o metal (o punk sempre foi mais um movimento social do que propriamente um estilo musical, sendo que os próprios punks assumem que os 'metaleiros' é que faziam música), uma nova geração de metaleiros estourou no mundo todo no início dos anos 80, fazendo com que o heavy metal virasse um fenômeno mundial, sendo essa onda conhecida como "New Wave of British Heavy Metal", destacando-se aí o Iron Maiden (acredito eu, a maior banda de heavy metal do mundo. up the irons!*), Saxon, Motorhead e Def Leppard.

Até hoje com alguns pequenos sustos - porcarias mesmo - como o Glam Metal (ainda nos 80) e a maior parte do Nu Metal (talvez Sepultura seja a única coisa a ser mencionada) e do Grunge, o heavy metal e suas vertentes se estabeleceram como uma forma clássica de música e até mesmo, como movimento cultural e social.

Não entendeu ainda?
Vá ouvir com paciência até aprender.

Se você perceber o virtuosismo de Niccolo Paganini em Eddie Van Halen (Van Halen) e Yngie Malmsteen por exemplo, não é mera coincidência.

Se você notar a teatralidade e o alcance vocal do Pavarotti em Rob Halford (Judas Priest), Bruce Dickinson (Iron Maiden) e Geoff Tate (ex-Queensryche) por exemplo, não é mera coincidência.

Se você achar Richard Wagner ou Gustav Holst em Black Sabbath, não é mera coincidência.

Se você viajar para a idade média com Ritchie Blackmore (Rainbow) por exemplo, não é mera coincidência.

Se você sentir Howlin' Wolf em James Hattfield (Metallica) não é mera coincidência.

Se você ouvir Robert Johnson em Led Zeppelin por exemplo, não é mera coincidência.

Se você for atingido por Buddy Rich através de Dave Lombardo (ex-Slayer) por exemplo, não é mera coincidência.

Se você tiver alguma alucinação visual com uma ópera ao ouvir Pink Floyd ou Rush por exemplo, não é mera coincidência.

Esses assuntos mereceriam livros. Muita coisa boa foi omitida.
Quis apenas desenrolar um pouco do porque fomos "acusados" de sermos velhos patéticos ouvindo música clássica.




 *up the irons é uma expressão usada pelos fãs e admiradores do Maiden. Uma espécie de grito de guerra, um trocadilho com a tradução da expressão ao pé da letra, o estilo musical e claro, o nome da banda.

sábado, 2 de março de 2013

A vingaça dos velhos headbangers

Há uns dias atrás junto com um velho amigo, relembrava nossa juventude nos anos 80, quando descobrimos o heavy metal.
Era 1983, 12 para 13 anos, quando ele chega com um EP (é um LP pequeno com menos músicas) desconcertantemente agressivo para a época, o Maden Japan do Iron Maiden.
As coisas chegavam por aqui com um ou dois anos de atraso mas fomos arrebatados pela música, estilo e claro, nessa mistura, o contestador e anárquico conteúdo.

Logo depois ele apareceu com o Piece of Mind, também do Iron Maiden, quando juntamos com o British Steel do Judas Priest de outro amigo, o Gratest Hits do Queen (ok, não é metal, mas como diz a música, "os metaleiros também amam" - e como podemos ver, tem senso de humor - além disso fazem parte da pré-história do metal) e o Crusader de Saxon meus e por fim, mas sendo só o começo, o Metal Health do Quiot Riot de um outro.

Devorávamos o que aparecia e juntávamos todas os parcos trocados para correr atrás de material novo e se possível importado (as prensagens de bolachão de rock no Brasil eram bastante precarias).
Iron Maiden, Judas Priest e Saxon foram os detonadores, e apartir daí Whitesnake, Van Halen, AC DC, Twisted Sister, Kiss e por aí vai.

Posteriormente esse caldo nos remeteu às origens e as variantes do bom rock e daí foram lotes de Deep Purple, Led Zeppelin, Black Sabbath, Pink Floyd, Rush, Who, Cream, Secos & Molhados, Jethro Tull, Mutantes, Hendrix, Plebe Rude e zilhões de outras coisas. Claro que jazz e blues mais tarde seriam inevitáveis.

Gravávamos algumas coisas em K7 e levávamos para dentro da sala de aula, mas os "anarquistas" que botavam fogo na lanchonete, roubavam pilhas nos mercados e saiam na porrada de vez em quando, no fim, respeitavam bastante os professores, não matavam os pais e nem uns aos outros.

No fim da história, ou melhor, do início pro meio dela, olhando nossos amigos, fomos nós que os professores e diretores mais gostavam e fomos os que, de um jeito ou de outro, criamos algo diferente do padrão pra vida.

O buraco musical dos anos 90 e início dos anos 2000 pareceu enterrar o heavy metal (glam metal e nu metal foram vertentes bastante amaldiçoadas por nós), mas os quarentões não se rendem tão facilmente e influenciando uma nova geração que não sucumbiu as mediocridades das divas e dos astros mauricinhos, resgataram seus heróis e junto com eles uma nova leva de grupos promissores aparecem nos últimos anos.

Como lembra o antropólogo Sam Dunn, a cultura heavy metal continua sendo a cultura dos excluídos.

Outro velho amigo brincou dizendo que somos velhos patéticos ouvindo música clássica.
De fato, nossos ídolos passaram para o "clássico", mas como não deixar de comparar duas ou três gerações que contestavam uma série de coisas para outras cujo máximo da rebeldia é comprar ipod's, usar anel de compromisso e fazer promessas de casamentos puros (sim, virgens!)?!

Fico feliz em ver que nossas escolhas foram boas o bastante para sobreviver à história. Fico feliz em ter sido um adolescente que descobriu isso bem naquela época.
O nascimento do heavy metal nos subúrbios industriais londrinos e sua adoção quase instantânea na região do ABC paulista, na época, um subúrbio metalúrgico de São Paulo.

É divertido ver em que irmandade se tornou o heavy metal e suas vertentes.
É gostoso ver os sessentões ou setentões cuspindo sangue e voando por cima da platéia ainda ou simplesmente vestindo um jeans e uma camiseta, fazerem uma música consistente e de qualidade, enchendo locais com gente de todas as idades.

Por outro, foi deprimente ver o que algumas bandas se tornaram ao entrar pro mundo dos contratos milionários. É difícil ver alguma dessas bandas manter o espírito do rock e principalmente do heavy.
Dee Snider do Twisted Sister reconheceu que é complicado fazer um som agressivo e de protesto quando se mora numa mansão, o que nos remete a Lacan que diz que a angústia é a única fonte de criação.

Seja como for, parodiando o pequeno-grande Ronnie James Dio (aliás o inventor do tal símbolo "manual" do heavy metal), "long live rock'n roll"!

E que meus amigos não fiquem surdos nem com cirrose para podermos celebrar etilicamente, mesmo que em cadeiras de rodas e com fraldões geriátricos, o bom e velho metal.

Up the irons!!