sexta-feira, 12 de julho de 2013

Bolhas e os bolhas

Há poucas semanas fiz meu calvário de subir a serra e visitar a insanidade.
Motivos de sobrevivência. O trabalho estava lá e quando ele me requisita assim pouco eu acho tolerável.

No retorno, quando estou tonto com tanta gente infeliz e raivosa, tanto barulho e fumaça e já num estado de desespero para voltar para minha nova cidadezinha, passo pelo corredor ABD para pegar a rodovia dos Imigrantes sentido litoral.

O corredor ABD é uma avenida que interliga Diadema, São Bernardo e Santo André, um lugar que sempre foi horrível e atualmente está horrível e intransitável.
No meio do trajeto, absorto em milhares de pensamentos, me vejo no meio de uma nuvem de bolhas.
A sensação era que eu estava dentro dos meus mais malucos sonhos, dentro de um carro, no caos urbano em meio a bolinhas de sabão.



Nesta viagem alucinante nada como ouvir Obscured by Clouds do Pink Floyd pra coisa ficar mais delirante. Dispensa LSD.
De repente um outdoor imenso surge no meio da nuvem de bolhas: "Flex Imigrantes, sua vida começa aqui".
Definitivamente achei que estava delirando e deixei de lado a garrafa de água mineral achando que ela pudesse ser transgênica (nada mais surreal que água transgênica, mas...).

Bom, as bolinhas vinham de uma vendedora ambulante que as fazia freneticamente num farol, e o outdoor estava a beira do empreendimento no corredor ABD.
Um conjunto habitacional "new COHAB" (versão classe média que há pouco tempo nem subempregados teriam vontade de adquirir), com 'amplos' 54m² (os grandes) e inacreditáveis 3 dormitórios e a tal varanda gourmet nesse espaço 'colossal'.



Sinceramente, nem em 100m² é razoável colocar 3 dormitórios. Talvez pros Umpalompas.
"Sua vida começa aqui" me parecia mais uma ameaça.

Um amigo meu atirou um: "Nós quase nem ficamos em casa, então aqui tá bom."
Isso porque ele era um vizinho num ap de setenta e poucos metros e dois dormitórios, o que pros padrões atuais devemos considerar bom.



Passado esse susto, refleti que quem estava viajando eram esses coitados que "começam a vida aí" e acabam em lugar pior e comum a todos, aqueles fatídicos 2m² a sete palmos do chão.
Passar a vida trabalhando e em locomoção para o trabalho, com deliciosos finais de semana em filas para achar vaga num shopping center e com eventuais "maravilhosas visitas a Disney", virou desculpa para dormir num buraco em lugar abominável.

Não me parece ser uma vida boa por mais que tente se argumentar a respeito da própria escolha.
Tudo isso não me parece valer as bugigangas inúteis que tais indivíduos adquirem para compensar essa maravilha de dia-a-dia, onde a patológica mania do Facebook e demais redes (anti)sociais em todo lugar parecem ser aqueles implantes de memória de filmes de ficção, onde o usuário busca se livrar momentaneamente da opressão do cotidiano.

Minha sogra, no Itaim, não escapa disso. Agora lá existe também o trânsito de helicópteros.
E o medo de abrir mão custa a vida de todos.

Passeatas? Manifestações?
Bacana, mas dêem a esses moleques um 'carguinho na IBM' e um carrinho reluzente que a rebeldia acaba.
E por tão pouco.

Tenho muitos amigos que eram hippies, alternativos, engajados, etc, que ao alcançarem o tal 'sucesso' (essa vida 'boa' descrita a pouco adquirida pelos emergentes do milagre econômico brasileiro), o que restou foram apenas discursos reacionários, conformados e cheios de medos. Sendo claro, de gente bundona e desprezível.

Ninguém quer abrir mão de nada.
Nada muda assim.
E viva os iPads, Tablets, motores x.0, Prozac, TV's finas, GPS's, Rivotril e tudo mais que puder apaziguar um pouco essas almas empedernidas.

3 comentários:

  1. Dia desses, li uma matéria surreal na Folha, caderno de imóveis, querendo convencer as pessoas de que é possível morar bem e confortavelmente em 27 (sim, vinte e sete) metros quadrados, tamanho de um apartamento novo, em bairro "nobre" (?!) para gente ocupadinha - acho que Vila Nova Conceição ou algo assim. Só mesmo com LSD pra achar espaço nisso.

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    1. A gente chega nos 9m², mas com apelos eco-isso, green-aquilo, praticidade e elegância, blablabla.
      Morei num de 70m e era claustrofóbico. Grana curta mas sem perder o senso crítico. rs

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  2. Ops... O comentário anterior saiu como anônimo. É a Malva aqui - http://malvamauvais.wordpress.com/

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